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sábado, 13 de novembro de 2010

E VÓS, QUE IMAGENS VENERAIS?

"A CRIAÇÃO DE ADÃO" (1511) - MICHELÂNGELO BUONARROTI 


Parece injusto, ilógico, incoerente, todavia para nós cristãos somos a imagem e semelhança de DEUS. Não meu pai do céu, não posso acreditar... No Livro Sagrado figura a seguinte profissão: “Façamos o homem à nossa imagem e semelhança. Que ele reine sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus, sobre os animais domésticos e sobre toda a terra, e sobre todos os répteis que se arrastam sobre a terra”. Então, se somos à imagem do criador, somos imagens. Por extensão, somos veneradores e venerados. Mas que imagens venerais? As imagens prendem nossa atenção... Desperdiçamos horas diante de uma caixa de imagens, todos os dias... Obviamente, prestando culto, veneração, consumindo os ícones da indústria cultural.  Preocupamo-nos, também, demasiadamente com a imagem refletida no espelho (culpa dos portugueses que nos deram espelhos e vimos um mundo idealizado e doente). Se pensarmos nos adoradores da auto-imagem, quantos pecados... Afinal, somos uma sociedade narcísica. Entretanto o texto bíblico não refere à estas imagens. 

Do caos, fez-se a terra informe. E, Deus deu forma à terra, às coisas, e a tudo que nela encerra.  A ideia de forma, imagem, principia toda a cosmogonia da criação... O homem (imagem e semelhança de DEUS) esqueceu, decerto, que reinaria sobre tudo, menos sobre os outros homens... Daí, impondo a própria imagem, ele construiu impérios de areia. O homem resolveu brincar de deus. Nessa brincadeira ele criou uma espécie de religião. Tornou-se mito venerado por um discurso místico mantenedor de suas potencialidades forjadas, do seu poder (discurso efêmero). E a imagem tem um papel crucial neste processo: a imagem é signo que remete diretamente ao significado, mesmo que falso.


"FACES DA MESMA MOEDA" - HITLER E SADDAM

À imagem performática, inorgânica (e não a que se assemelha ao DEUS), na contemporaneidade, podemos atribuir o mesmo sentido de religião. Há uma espécie de culto, veneração, constante e (in)consciente à imagem. Dessa forma novos mitos, ícones planetários, surgem todos os dias e arrastam multidões para cultuá-los em palcos. Outros, de tanto insistir, impõem suas imagens e deixam nossas retinas fatigadas, ofuscadas, verdadeira cegueira social; pior, quase sempre não pensamos nem refletimos os significados reais a que elas remetem – auto-alienação. Dois exemplos ilustram claramente este processo: Adolf Hitler e Saddam Hussein. Ambos criaram uma projeção tão forte da auto-imagem que construíram impérios aparentemente indestrutíveis. Nestes impérios, onde um homem reinava sobre os homens. Todas as atividades, comemorações cívicas, tudo se tornava motivo de culto, de exaltação às imagens do deus-homem. Hoje os outdoors são os santuários, as vitrines, onde os deuses despóticos erigem suas imagens. Os transeuntes são os devotos e, se entregam a veneração incondicionalmente, sem nem avaliar se o santo é "do pau oco" ou não.


 Vivenciamos, hoje, esse tipo de ditadura deliberada da imagem? Temos prestado culto a que imagens, ultimamente? Que imagens foram/estão projetadas nas mídias de nossas cidades?... Pena que a grande maioria dos seres “humanos”, que se dizem cristãos, não venera as imagens sagradas, aquelas que reportam a significados que são verdadeiros exemplos de entrega, renúncia, resiliência, resignação, perdão, amor ao próximo, FÉ... Imagens que nos fazem repensar/refletir nossas práticas. Paradigmas que consubstanciam a ideologia cristã. Santos signos, carregados de sentidos... Não imagens inócuas, vazias, estereotipadas, que não significam nada além da aparência mais exterior: “sepulcros caiados...”. Pois no interior só há putrefação... Entretanto, ratificamos que somos cristãos... Onde? Nos templos... Quando? Quando nos é conveniente... 
(Hadson de Sousa)


sexta-feira, 5 de novembro de 2010

GOSTOSA CAÁPANEMA DE OUTRORA...


GOSTOSA CAáPANEMA DE OUTRORA...


Não podemos voltar ao passado para reviver, contudo nossa mente tem o poder de reconstruí-lo... Mesmo que implique em releituras nem sempre tão autênticas. Muitas vezes, isto se torna um fato indesejável. O universo onírico, também, possibilita-nos uma viagem e rompe com as marcas da temporalidade, fazendo-nos fugir desta perene certeza de que vivemos sempre e exclusivamente no presente... É no mundo dos sonhos, na obra “Belém – Capanema”, da autora Marta Navegantes, que podemos reviver uma Capanema que não existe mais.

Uma impossível viagem de regresso a um universo que se transformou pela ação dinâmica do tempo. Mas que na obra torna-se possível, pois a narrativa-documentário é composta a partir de uma viagem “real”, com saída de Belém com destino a Capanema (com um detalhe: “por dentro”, como se dizia antes). Contudo, isso é apenas pretexto para a viagem saudosista e surreal com destino a Capanema de lendas de mata caá e caças panemas. Há, portanto uma meta-ficção. Ou seja, a narrativa desta obra cria uma realidade ficcional e desemboca em outra, ficcional também. Assim o leitor é convidado a reviver uma gostosa Caápanema de outrora, com suas ilustres personas/personagens: O Navegantes, Dona Maroca, Izaura das flores, Zé Correeiro, Dona Luizinha e Seu Neco, Zé Alfaiate, Raimundo pau-velho, Dr. Roberto, Dr. Jorge, Joãozinho Wanderley, Hugo Travassos, Irmã Terezinha, Irmã Clementina, Padre Sales e tantos outros...


Uma viagem, permeada com poesia crítico-reflexiva, para a Capanema em pleno processo de urbanização: a mata azarada dá lugar “ao concreto civilizatório”. A Capanema desfolhada Sem murucututu, sem matintapereira, / sem riacho dourado, sem cheirosa açucena, / Foi ficando sem graça, sem eira nem beira, / Capoeira sem caça, foi ficando caá-panema. A Capanema da igrejinha humilde e aconchegante, mais conhecida por Paróquia de Nossa Senhora do Perpetuo Socorro, que guardava em sua estrutura e em tudo o que rodeava, o suor e os sonhos de boa parte da acanhada população. A Capanema do confidente coreto cor-de-rosa da praça da igreja e, das noites do Arraial; onde ricos e pobres participavam do festejo sem o preconceito do ter e não ter. A Capanema da Estação do trem no coração da cidade: Avenida Barão de Capanema.


Enfim, “Belém-Capanema” é um retrato feito de palavras e revelado com muita sensibilidade, trabalhado à pena, carregada de emoção. Para alguns leitores que lá se encontram ou encontram seus familiares uma catarse interior, uma viagem, um desembarque na estação. Para outros, a oportunidade de conhecer nossa cidadezinha com cheiro de mato, mas sem a cor cinza e aquele cheiro desagradável que anuncia a chegada na cidade hoje... A Capanema como desabafa a autora: Quem dera não fosses hoje / tão em desenvolvimento, / tão mais dura, outro elemento, / tão concreta, sem calor para corresponder.